"Um homem precisa viajar. Por sua conta, não por meio de histórias, imagens, livros ou TV. Precisa viajar por si, com seus olhos e pés, para entender o que é seu. Para um dia plantar as suas árvores e dar-lhes valor. Conhecer o frio para desfrutar o calor. E o oposto. Sentir a distância e o desabrigo para estar bem sob o próprio teto. Um homem precisa viajar para lugares que não conhece para quebrar essa arrogância que nos faz ver o mundo como o imaginamos, e não simplesmente como é ou pode ser; que nos faz professores e doutores do que não vimos, quando deveríamos ser alunos, e simplesmente ir ver”. Amyr Klink.

terça-feira, 19 de abril de 2011

A trilha Inca

Um dos motivos dessa viagem foi fazer a "trilha inca". Quem conhece Osmir sabe que quanto bota uma coisa na cabeça... Bom, estávamos na expectativa da trilha, numa mistura de estresse, euforia, medo de não conseguir... sei lá. No domingo à noite nos reunimos com o guia Danny Castilho que iria nos acompanhar durante o trajeto. Recebemos o mapa, recomendações e verificamos também o que seria realmente necessário levar. Branca, diante da explicação do guia quanto ao frio que passaríamos nas noites, resolveu pagar um mico daqueles perguntando se haveria aquecedor na barraca... sem comentários. Imagine a cara da gente naquela situação... Na terça-feira partiríamos para fazer a trilha Inca.



A trilha é realizada em 4 dias e 3 noites. São 46km de percurso, iniciando em Piskacucho, no km 82 da ferrovia que liga Cusco a Águas Calientes, a uma altitude de 2.600 metros sobre o nível do mar (m.s.n.m.). Existem 3 pontos culminantes ao longo da trilha, que chamam de passos. Os dois mais altos são percorridos no 2º dia (4.200 e 3950 m.s.n.m.) e o 3º (3.670 m.s.n.m.) no 3º dia. Machu Pichu está a 2.400 m.s.n.m.



Partirmos para o primeiro dia da trilha Inca bem cedinho, por volta das 4h, com a van pegando a gente no hotel. Fomos os primeiros e, como ainda teria que pegar os demais trilheiros, tivemos a oportunidade de contemplar a Cusco em plena madrugada. Para nos acompanhar na trilha subiram as duplas Larissa (brasileira/peruana) e Nicolas (argentino), Tereza e Angela (americanas de Los Angeles, que falavam bem espanhol). Com o dia clareando, pegamos a estrada rumo ao chamado Vale Sagrado. Vale ocupado por civilizações anteriores à chegada dos espanhóis, com ruínas históricas e fértil onde, segundo o guia (acredite se quiser), são cultivados milhares de espécies de milho e batata. Nosso destino nesse vale foi o km 82 da ferrovia, de onde descemos para começar a nossa aventura de 4 dias e 3 noites até chegar à Machu Pichu. Na foto, na entrada do parque no Km 82, Eu, Osmir, Branca, Tereza, Angela, Larissa e Nicolas.



Nas nossas mochilas somente o "essencial": saco de dormir, manta isoladora, mudas de roupas, protetor solar, repelente, artigos de higiene, incluindo os lenços para banhos em bebês, máquina fotográfica, alguns chocolates, garrafas de água, e para carregar - para não dizer nos carregar - um "santo" cajado comprado a 5 soles (menos de 1 dolar).



A caminhada mesmo, no primeiro dia, após passar pela entrada do parque, começou por volta de 10h45 da manhã, sob um sol escaldante. Começamos a caminhar felizes, contemplando toda a paisagem magnifíca, margeando o rio Urubamba.


Após umas duas horas, já com misto de fome e cansaço presentes, a coisa começou a ficar complicada. Frio, nem sinal... um calor que minhas costas logo ficaram molhadas. Ao longo da trilha aprendemos que os referenciais de distâncias dados em horas pelo guia não correspondiam aos nossos. Quanto ele dizia que faltava 1h, nós olhávamos entre si e sabíamos que seriam 2h. Nesse primeiro dia o almoço foi por volta de 15 horas. No local, era tudo bem arrumado. A trilha era feita com o suporte de carregadores. Eles carregavam todo o material necessário (barracas de dormir para a gente, barraca restaurante, mesa, cadeiras, panelas, fogão, água, comida, gás, lampião, home theater, tv led de 42"... brincadeira, esses dois últimos itens não faziam parte rs. Retornando ao almoço, foi nele que demos conta de toda a estrutura montada para fazer a trilha. Não existem, acho porque não é permitido, instalações permanentes ao longo da trilha, então todos acampamanentos são montados e desmontados todos os dias. Almoçamos e, após brevíssimos 15 min de descanso começamos a partir rumo ao local de domir. Danny, um dos guias, disse que iríamos começar a subir um pouco a montanha... pois, até então, tínhamos caminhado praticamente no plano. Começamos a subir, com a paisagem mudando também.... a vegetação era mais verde, como floresta. Gente, na subida você começa a pensar mil coisas, desde o que você está fazendo ali, até aquele estojo de óculos pesado que colocou na mochila e que, sob altitudes de mais de 3000 metros (onde iríamos dormir estava a 3.300 m.s.n.m.) pesam na mochila quilos e quilos. Tudo dói... costas, ombros, pernas... ... ... no comecinho da noite chegamos ao acampamento. Barracas já montadas, os carregadores, os mesmos que tinham montado o almoço e ficaram lá para limpar tudo, desmontar o acampamanento, passaram a gente na trilha, chegaram horas e horas mais cedo e aprontaram tudo no acampamento da noite, até a comida já estava pronta. (na foto abaixo (by Nico), o grupo todo, guias, cozinheiro, carregadores e a gente)



Nos momentos difíceis as pessoas desejam coisas que lhes fazem mais falta. Alguns diriam comida, outros uma piscina, cerveja gelada... para mim, naquele momento, seria uma suíte bem confortável, seria a satisfação de duas necessidades: cama com travesseiro bem confortável e um banheiro limpo. Bom, na real, não tinha nenhuma das duas.... "prefiro não comentar" rs.


Na noite, sob luzes de lampião e lanternas, jantamos e os guias Danny e Joana deram as instruções do 2º dia, o dia mais puxado da trilha, com 12 horas de caminhada e em que passaríamos pelos dois pontos mais altos da trilha... ou seja, seriam duas subidas incrivéis e intermináveis (constatamos depois) de montanhas.



A paisagem é fantástica.... ficar acima das nuvens, a 4200 metros de altitude sobre o nivel do mar.... (um pouco de geografia: o Pico da Neblina, localizado no norte do Amazonas e considerado o ponto mais alto do Brasil, tem 2.993,78 metros.)... claro que essa altitude vem junto com alguns fatores que dificultaram a nossa caminhada: falta de oxigênio, dor de cabeça, limitação da nossa capacidade física, calos nos pés - ok, essa última não é culpa da altitude!


Meu joelho esquerdo resolveu se manifestar logo nesse segundo dia... e nos terceiro e quarto também. Daí, me sentia como se tivesse uns 70 anos.... vendo uns de 60 passando por mim com a maior facilidade durante a trilha. Chegamos no acampamento da 2ª noite já sob luzes de lanternas... também, após 12 horas de caminhada, já era bem noite quando chegamos. Não sabíamos se estávamos com fome ou com vontade de deitar e dormir.


Estava fazendo bastante frio.... esse acampamento ficava rodeados de montanhas e o céu, sem lua, deu um espetáculo com as estrelas. Mas o cansaço e o frio foram tantos que logo desmaiamos.


O 3ª foi mais tranquilo... não sei porque teve menos subidas e descidas ou porque já estávamos mais acostumados... aliás, o último trecho tinha um zig-zag descendo para chegar ao acampamento que era interminável... com o meu joelho tinha que ir a passos lentos. Aproveitava para observar a flora local, com várias orquídeas, até chegar ao acampamento, que foi o melhor, pois havia local para banho, com água quente e tudo... #"prefiro não comentar".



Quarto dia, dia que iríamos chegar em Machu Pichu. Bem cedo, 4h da manhã, o pessoal já estava acordando a gente com chá de coca na porta da barraca. Após o café, 4h30 já estávamos na fila do controle do parque. Estava caindo uma chuva fina e fria. Abriu a "porteira" e começamos a última parte da trilha, sob luzes de lanternas mas logo começou a amanhecer.... e vimos como era bonita essa parte. A trilha era serpenteando a montanha, com precipícios bem íngrimes, mas muito bonita... com trechos de escadões e outros em planos. Chegamos ao portal do sol por vola de 7h.... de lá, se não estivesse coberto por nuvens e neblina, veríamos a cidade de Machu Pichu. Fizemos um lanche para esperar abrir um pouco a vista, mas nada disso aconteceu... e continuamos a trilha, só de descida, até a Machu Pichu. Às 9h estávamos na entrada da cidade, cansados mas muito felizes e realizados. Ficamos contemplando a cidade por minutos, passando pela cabeça todo o percurso, admirados com nós mesmos por termos feito tudo aquilo.

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